Ataque na Lua Cheia
Algumas coisas são simplesmente difíceis de acreditar.
Fazia três meses que estava namorando Helena, nosso terceiro
mês de namoro. Nunca fui tão feliz com uma mulher em toda minha
vida. Combinamos de nos encontrarmos às 22hs na boate em que
nos conhecemos.
Quando nos encontramos no interior da boate começamos a
dançar. Dançamos a nossa música – Bring me to life – nossa
primeira música. Após alguns balanços e algumas cervejas fizemos
o mesmo plano do nosso primeiro fica, dispensamos meu carro no
estacionamento e caminhamos até o parque a duas quadras da
boate, para ficarmos sozinhos.
A lua estava cheia e fazia um pouco de frio, exatamente como
na primeira vez. Retirei minha jaqueta e vesti Helena com ela,
protegendo-a do frio. Nos encostamos na mesma árvore e
começamos a nos beijar. Estávamos fora de vista, ninguém podia
nos ver, ninguém podia nos atrapalhar. Exatamente como dá
primeira vez.
Helena então pára e pergunta se ouvi algo. Eu sorri dizendo
que não e mesmo assim ela insistiu em dizer que veio da escuridão
atrás de minhas costas. Virei-me, afastando-me dela e perguntando
onde. Escutei um uivo de lobo bem próximo e em seguida o grito de
Helena.
Ao voltar-me para trás, a vi sendo arrastada por detrás das
árvores. Assustado e de coração acelerado, corri para socorre-la. E
entre seus gritos pude ouvir uma respiração ofegante de um animal.
Desesperei-me.
Corri entre aquele pequeno bosque escuro seguindo os gritos
de Helena até que, subitamente, pararam. Gritei por ela, gritei tão
forte e alto quanto minha garganta suportava.
Após dez minutos de gritos e berros, encontrei Helena aos
pedaços, jogada numa árvore cujo tronco tinha um grande
diâmetro. Mal pude me agüentar em pé olhando aquela
barbaridade. Seus braços estavam cheios de rasgos e faltava um pedaço do seu ombro e da garganta. No momento em que caí de
joelhos, chorando, fui iluminado pela lanterna de um policial que
me mandou pôr as mãos para cima, apontando sua arma.
No distrito de Polícia falei tudo que aconteceu passo a passo.
Falei do aniversário de três meses, da boate, do carro que estava na
boate, cujas chaves estavam comigo e as já tinha entregado, a
caminhada no parque, a jaqueta, o barulho, o uivo, o grito e a
minha procura pelo bosque. Tamanho foi o meu desespero ao
contar que um dos interrogadores falou para o outro “Esse cara é
um homem sem sorte que teve a namorada assassinada. Ele é
inocente”.
Fui liberado quase as 5:00 da manhã. Foram pegar o meu
carro na boate e o trouxeram até mim. Esperei até que o veículo
chegasse, pois tinha dito aos investigadores que eu tinha condições
de dirigir.
No caminho de casa, debaixo de lágrimas e dirigindo devagar,
eu pensava na desgraça daquela noite. Uma coisa me chamou
atenção naquele momento... Os investigadores falaram que não
tinham encontrado minha jaqueta no corpo de Helena e nem nas
proximidades. Foi como uma adivinhação, naquele exato momento
eu passei ao lado de uma jaqueta em uma calçada. Freei
repentinamente o carro e saí com pressa do mesmo. Incrivelmente a
jaqueta no chão era a minha. Estava suja de sangue e no chão tinha
manchas enormes do mesmo liquido e seguiam como uma trilha
para dentro de uma reserva.
Resolvi seguir a trilha, mas na rua em minhas costas parou um
carro. Era um dos investigadores e queria saber o que eu estava
fazendo ali. Mostrei-lhe a jaqueta e disse que era a que tinha dado a
Helena e em seguida mostrei a trilha. O tira olhou para mim e
retirou a pistola mandando eu ir para casa dormir e não o
atrapalhasse no trabalho. Eu falei que ia junto dele e depois de uma
discussão ele concordou em me deixar ir junto.
Estava próximo do sol nascer, a lua ainda estava alta, mas
notava-se que aos poucos ela estava baixando. Seguimos a trilha
por alguns minutos até uma pequena clareira onde o rastro sumia. Ouvi um uivo de lobo e alertei o investigador, que ouviu também.
Começamos a olhar para todos os lados conforme o uivo ficava
cada vez mais forte. Eu olhava entre as árvores e parecia que o uivo
estava vindo da própria escuridão. E quando ouvi a ofegante
respiração daquela coisa... Vi seus olhos vermelhos entre as árvores
e alertei o investigador. Quando o mesmo avistou aquela gigante
sombra pulsando na escuridão, apontou sua arma no exato
momento em que o dono daqueles olhos intimidadores revelou-se.
Corpo de homem e cabeça de lobo. Braços longos armados
com garras do tamanho de um lápis, totalmente revestido por uma
pelugem escura e um focinho com uma boca espumante mostrando
quatro presas afiadas e amarelas. Era um autêntico lobisomem.
O investigador disparou três vezes conforme o monstro
avançava. O lobisomem caiu inerte no chão. Eu suspirei de alívio.
Não acreditava em lobisomem, mas acreditava em meus olhos.
Aquela coisa devia ter uns três metros de altura. O sol nasceria em
segundos, eu procurava a lua no céu e não a achava. O investigador
aproximou-se do bicho e o virou com o pé direito. Para meu
lamento, o monstro levantou o tronco e atacou o investigador, a
garra rasgou-lhe o ventre. Cheguei a ver as entranhas humanas na
garra do lobisomem depois que o policial caiu.
O monstro levantou-se e me olhou. Entre nós estava o
investigador morto. Eu era o próximo alvo. Estava diante do
assassino de Helena, aquela ofegante respiração era inconfundível.
O monstro me atacou assim que senti os primeiros raios solares
aquecerem confortavelmente minha face. Com um salto enorme ele
avançou contra mim. Escapei milagrosamente me jogando de lado,
caindo no chão. O segundo ataque seria mortal. E num movimento
rápido ele saltou em cima de mim novamente. Levantei os dois pés
apoiando-os em seu estômago e o joguei no chão. Mal pude
acreditar. Levantei-me e olhei o bicho levantando-se também. Agora
ele não parecia tão grande. Avançou contra mim dando um golpe
com sua garra letal. Incrivelmente desviei e preparei um soco que
seria direto no focinho dele. Parecia que aquele sol me dava forças.
Acertei o focinho do bicho, fazendo-o recuar e em seguida dei-lhe socos consecutivos, acertando todos. Conforme ia batendo, ele não
mostrava nenhuma defesa. Notei que ele estava diminuindo seus
pêlos, seus músculos, seu tamanho. O sol brilhava forte e um homem
estava estirado, nu, no chão a minha frente. Antes, algo entre
homem e lobo, agora, um pequeno e raquítico homem comum.
Pela segunda vez, me mandaram erguer as mãos. Era a polícia
novamente. Falei tudo que tinha se passado.
Aquele homem era um mendigo conhecido como Fuscão. A
única coisa que o ligou ao crime, exceto a pele encontrada em suas
unhas, foram essas mesmas que eram de tamanho exagerado e
afiadas, descuidadas sob o ponto de vista policial. O que falei de
nada valeu. Fui apenas ridicularizado. Por enquanto tinha acabado.
Mas eu sei o que vi e não sou nada burro.
Pesquisei como um louco sobre lobisomens. Livros, artigos,
alguns caçadores de mistérios de merda até que cheguei a
conversar com uma velha misteriosa. Ela me contou algumas lendas
sobre lobisomens. E estas não estavam longe do folclore e de
Hollywood. No próximo ciclo da lua cheia ele despertaria
novamente. Só que no próximo ciclo, eu estaria esperando por ele.
Essa besta pagaria por ter tirado Helena de mim.
Na próxima lua cheia eu fiquei a uma distância discreta e
segura em frente ao Departamento de Polícia que o mantinha preso.
A lua cheia apareceu no céu e não demorou muito para que uivos e
gritos de desespero pudessem ser ouvidos vindos de dentro do
departamento. Eu nada podia fazer a não ser esperar e agir na hora
certa. Após cinco minutos eu atravessei a rua do departamento, meu
sobretudo esvoaçava a cada passo meu sob o forte vento que
soprava. Retirei de dentro do mesmo uma pistola com munição de
prata. Eu tinha preparado cuidadosamente para aquela noite.
Entrei no recinto e comecei a andar pelo local, sempre
seguindo o som de tiros e carne sendo rasgada. Eu andava por um
corredor estreito quando ouvi o som de ossos quebrando e a parede
ruir. De repente, a mesma cedeu e um homem caiu falecido em
minha frente. Olhei para a nova passagem e dela veio um vulto
enorme e rápido, não consegui definir de primeira vista, apenas senti o ombro arder e meu corpo ser jogado contra a parede, caindo
sentado. Não soltei a arma, apesar de não ter visto eu sabia o que
era e minha única esperança, segundo o que tinha aprendido era
essa munição. Meu ombro foi rasgado e o sangue quente escapava
pela ferida. De cabeça baixa, ouvi aquela respiração ofegante
próxima de mim. Ergui a arma a minha frente e atirei três vezes.
Cada disparo meu foi respondido com um uivo dele. Acertei-o
mesmo sem ver. Quando ergui a cabeça, com dificuldades devido ao
ferimento grave, o vi em minha frente na mesma posição que eu,
encostado na parede. Aquele corpo peludo ainda respirava.
Descarreguei o resto do pente, e conforme ia atirando, vi sua forma
reverter para a humana novamente.
Ouvi sirenes. Era a polícia. Quem iria acreditar? Eu devia ter
contado a verdade!? Ah, mas eu contei...
E hoje, aqui estou. Preso nessa camisa de força, dentro desse
quarto branco... Nesse sanatório de segurança máxima. Hoje faz
exatamente uma lua desde que matei aquele lobisomem. Ontem,
tentei explicar para o enfermeiro do turno da noite. Ele riu de mim.
Agora a pouco ele passou aí na porta avisando que o jantar seria
servido em dez minutos. Avisei a ele e, novamente, tornou a rir de
mim. Não tenho nada aqui que sirva de ajuda para mim. Deus sabe
que não tenho culpa, Deus sabe que tentei... Fui ferido... Deus...
Está começando... Está... Ahhh!
Ataque na Lua Cheia
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